quinta-feira, 14 de março de 2013

ENTREVISTA COM BRUNO VALENTIM


Bruno Valentim, tem o seu firmado no universo desportivo nacional e internacional. Depois de ter conquistado vários títulos, em Boccia, decidiu mudar de modalidade e cedo, assumiu, lugar de destaque nesta nova aposta. Mais uma vez, se afirma como um desportista ambicioso e sem limites para atingir as suas apostas, mas não deixando de criticar a politica desportiva do país, que tanto o tem condicionado, como a outros atletas.
Um exemplo!  

Depois de uma carreira desportiva, na modalidade de BOCCIA, muda-se para o tiro. O que o levou a essa alteração?
A mudança para o tiro é simples de explicar: já fiz mergulho desportivo, já joguei boccia, já pratiquei vela adaptada… ora bem, só faltava andar aos tiros. Parece não haver nada em comum todavia são tudo actividades de baixa carga física e que se adequam à minha doença e eu gosto de ter uma actividade física para complementar a minha actividade profissional.

Como se processou a adaptação ao Tiro?
Foi um verdadeiro desafio (e uma despesa das maiores) uma vez que não havia tiro adaptado em Portugal:
Primeiro, em 2009 tive de aprender o básico da modalidade, comprei livros, passei horas na net, fui à Galiza falar com um atirador espanhol e desloquei-me a Alicante para assistir a um campeonato e ser classificado funcionalmente para ver qual seria a minha classe de tiro;
Segundo, fiz um curso de acesso ao exame federativo, comprei a arma, o fato e outro material;
Terceiro, tirei a Licença Federativa, montei a minha carreira de tiro no BFC, e comecei a treinar com um aluno (Marco Alves);
Quarto, comecei a participar em provas no estrangeiro (a primeira em Setembro de 2010 foi e Inglaterra);
Quinto, fui-me dando a conhecer à Federação Portuguesa de Tiro apresentando relatórios das minhas deslocações.

Qual o local em que treina e quantos treinos realiza semanalmente?
Treino na antiga sala de boxe do B.F.C., onde como já referi instalei uma linha de tiro e um sistema de “falling targets”, mas também em casa e na piscina. Realizo 5 a 6 treinos semanais (cerca de 14 horas) que incluem treino mental, treino com Scatt, musculação e manutenção da forma e tiro real.

Tem algum treinador especializado nessa modalidade, ou treina sozinho?
A modalidade de tiro que pratico (tiro paralímpico = tiro adaptado = tiro ICP/ISSF) não precisa de um treinador específico, apenas de um treinador de carabina de ar comprimido ISSF.
Em todo o caso treino sozinho, ainda que agora já tenha o apoio do seleccionador nacional de carabina. Infelizmente, em Portugal, há muita gente com o curso de treinador mas pouquíssimos são treinadores e destes apenas alguns sabem realmente da coisa.
É assim o nosso país, esbanjou-se (e esbanja-se) muito dinheiro em formações inúteis. É como aquela coisa da formação de formadores para formar formadores e depois os verdadeiros professores não arranjam trabalho.

Quais os resultados mais significativos que conseguiu até agora?
Em termos de medalhas e essas coisas não consegui nada, pelo contrário tenho ficado sempre na segunda metade da tabela classificativa. Acontece que o tiro é uma modalidade técnica com uma componente mental dominante e, portanto, precisa de muita aprendizagem e trabalho em coisas muito finas. E, ainda bem que também é assim na sua versão paralímpica e não é uma “chanchada”, depois a competitividade é muito elevada, havendo inclusivamente alguns atiradores paralímpicos que também são atiradores olímpicos, para além dos seleccionadores e treinadores serem também muitos deles ex-olímpicos.
Em todo o caso o meu recorde nacional é de 600 em 600, e isso é muito bom.

Que objectivos têm para o futuro a nível desportivo?
Desde logo tornar-me um excelente atirador, no sentido mais abrangente do termo, para ter prazer na actividade e fazer dela o meu passatempo até daqui a muitos anos. Contudo, tenho objectivo de vir a ter o mérito de poder participar nos Jogos Paralímpicos do Rio de Janeiro, depois de até lá ter prestado bons desempenhos em diversas provas internacionais.

Existem provas nacionais oficiais da modalidade?
Não especificamente, até porque não temos juízes para ajuizar acerca dos regulamentos específicos do IPC (tiro paralímpico). Em todo o caso como cada um está na sua linha de tiro é-me indiferente quem é o parceiro do lado e o importante para mim é saber que estou a atirar nas condições em que atiro nas provas internacionais. Assim, tenho até cerca de 30 provas nacionais onde posso participar de acordo com os regulamentos ISSF (tiro olímpico) que são os mesmos excepto algumas adaptações (fato e a cadeira de rodas) e a classe funcional.
Para além disso entro em provas com os nossos melhores atiradores nacionais.

Tenho que conhecimento – não oficial – da sua convocatória para os trabalhos nos próximos jogos. Confirma?
Não, o que já é certo é que vou é participar em Abril numa Taça do Mundo na Polónia e em Setembro vou ao Campeonato Europeu. Pelo meio vamos ver se consigo patrocínios para a mais provas. Os próximos jogos Paralímpicos ainda estão muito longe e o que devo é conseguir entrar no projecto paralímpico porque os meus resultados têm, há dez provas nacionais, ficado sempre acima do mínimo paralímpico da paralimpíada anterior.

Quais as dificuldades, que tem encontrado para se manter em actividade, lutando pelo topo nacional?
Nenhumas, uma vez que só eu é que estou neste nível. Agora o topo onde me encontro em termos de qualidade e pretendo subir ainda um pouquinho mais é que apresenta “dificuldades”. De facto, não ter treinador é complicado e obriga a uma grande determinação e perseverança, porém, modéstia à parte, tenho essas qualidades.

Tem tido alguns apoios materiais?
Sim, e imateriais também (da minha família, de amigos, do Sr. Pina, da Cristina Almeida, da presidência e dos directores do B.F.C. e de muitas outras pessoas). Materialmente tenho do B.F.C. que me cede uma sala (e algum financeiro na medida das possibilidades actuais do clube), da Associação dos Amigos do Boavista tenho actualmente apoio financeiro para me deslocar uma vez por mês a provas nacionais ao sul (entre outros apoios maiores no passado para ir ao estrangeiro), já tive apoio financeiro do Dr. Eduardo Matos e da Junta de Freguesia de Ramalde, da Blasport/Macron já tive equipamento e, actualmente, já tenho o apoio da Federação Portuguesa de Tiro nas deslocações a Lisboa para estágios de selecção e nas próximas idas à Polónia e ao Campeonato Europeu.

Esta modalidade apresenta-se como sendo uma modalidade de custo elevados para a sua prática. Confirma? E como tem sido possível essa manutenção?
Isto é sempre relativo, pois se um clube tiver meios e equipamentos os atletas não têm custos na iniciação. O problema é que eu quis “praticar natação mas tive de construir e pagar a piscina”, porque não existiam condições no Porto nem para tiro normal nem conhecimentos em Portugal de tiro paralímpico. Vai daí, entre arma e outro equipamento e idas ao estrangeiro até ter resultados de monta, gastei para cima de vinte mil euros.
Enfim, neste como noutros casos no início de algo funciona muitas vezes o efeito de “pescadinha de rabo-na-boca”: não nos dão apoio porque não temos resultados, mas como sem apoio não se conseguem resultados lá põe a pescadinha o rabo na boca.

O Campeão de Boccia, pode dar lugar ao Campeão de Tiro?
O tiro é de uma improbabilidade muito grande no que concerne a resultados, para além de que um atirador leva dez anos a formar-se. O que espero é tornar-me um excelente atirador e permanecer nessa condição durante muito tempo para merecer representar o Boavista cá dentro e Portugal lá fora

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